quinta-feira, 20 de agosto de 2009

o trem para woodstock


Faz poucos dias vi na TV um documentário sobre o festival de Woodstock que celebrava os 40 anos do evento. Como sempre nesses documentários, os cinegrafistas e fotógrafos que registraram o momento saem em busca das pessoas que tornaram suas imagens famosas, para que a gente assista com curiosidade as mudanças desses personagens. Uma espécie de "antes e depois" da vida real. Vendo essas pessoas resgatadas fica a impressão de que para umas a vida seguiu e para outras, poucas, o tempo cristalizou naquele momento. Elas vivem da lembrança e tentam a todo custo negar a passagem do tempo.
Alguns anos atrás fui à Mauá passar um final de semana. Cidade isolada por uma estrada horrorosa, a que todo mundo se refere como o lugar que tem "um clima mágico", não no sentido metereológico.
Voltei de lá um pouco insegura com o tal "clima". Senti como se a maioria das pessoas que decidiram mudar para lá tivessem contagiado o lugar com um clima de nostalgia. Parecia que todos haviam perdido o trem para Woodstock e por isso ainda estavam ali: na esperança de que ele voltasse lá um dia.
Nada contra a rebeldia e contestação da juventude daquele tempo, aliás, admiro gente contestadora, até acho que passividade é sinal de pouca inteligência.
Apenas acho que com a passagem do tempo as questões que levaram aqueles jovens a contestar e se rebelar mudaram, já que os problemas globais, injustiças e instituições também mudam. Modismos a parte, a identidade visual daquele tempo tinha uma relação com a cultura pop do momento.
Nada mais anacronico que uma passeata contra a guerra do Vietnã ou contestando a ditadura militar. Outras guerras e outros poderes oprimem os tempos modernos. Ter ou não ter cabelos longos não é mais uma atitude de contestação social e sim de preferência visual.
Ainda hoje, me espanto ao ver personagens empacados naquela época, visualmente engajados em mostrar que realmente perderam o trem para Woodstock e ainda esperam que ele volte, descarrilado e aloprado, atropelando os acontecimentos, igual o bondinho de Santa Teresa.
Esses personagens, todos já sexagenários, me encantam. Fico até embaraçada, porque me pego observando com uma curiosidade enorme, tentando desvendar como são, que fazem, que os leva a se manter presos a um momento que já passou. Infelizmente são relativamente raros de encontrar.
Há um mês assisti uma peça, remontagem do musical Hair (que eu adoro) e me vi, entre deslocada e encantada, num teatro lotado desses personagens.
Em principio pensei que além da conexão direta com Mauá ali havia ficado esquecido um vagão inteiro e legitimo do tal trem para Woodstock.
Depois notei, com algum desapontamento, que os passageiros do trem eram poucos. No teatro havia centenas de pessoas "fantasiadas" de hippies. Pessoas que nem eram vivas naquela época ou não tem a menor noção do que significou todo aquele movimento cultural. Percebi depois, que na calçada em frente ao teatro, vários camelôs vendiam toda sorte de reprodução de modismos daquela época: batas, medalhões, bolsas indianas e até fotografias dos ídolos ressuscitados. Era uma espécie de self-service dos anos 60.
Fiquei pensando: Será que essas pessoas assistem o Mágico de Oz com roupa de Homem de Lata ou Dorothy? E a Gaiola das Loucas? Quantos vão ousar comparecer à caráter?
Tudo bem, muitas Princesa Léia e Darth Vader aparecem, além dos meninos com raio na testa que se multiplicam a cada novo Harry Poter lançado, mas isso são casos patológicos de identificação extrema ou de desmedido culto ao mito.
Agora macaquice tem limite!
Perder o trem para Woodstock já é melancólico, mas atropelar o bonde andando, sem nem saber para onde ele vai, depois trocar de vagão e roupa em cada fila de espera, sem qualquer identificação pessoal, é no mínimo burrice.

Um comentário:

Alexandre disse...

O trem traduz movimento e a idéia de transporte. Perdê-lo, não necessariamente significa a estagnação, mas sim ter encontrado a paz tão almejada, independentemente do mundo ter continuado "a rodar". Infelizes os que permanecem na procura.